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Opinião
Guaíra, 23 de agosto de 2015 - 16h17

O governo planeja criar dois fundos que, em tese, vão ao encontro de bons propósitos da sociedade. O primeiro tem o objetivo de “reduzir as desigualdades socioeconômicas regionais, custear a execução de projetos de investimento em infraestrutura e promover maior integração entre as diversas regiões do País”. E o segundo objetiva “auxiliar financeiramente os Estados e o Distrito Federal durante o período de convergência das alíquotas do ICMS” nas transações interestaduais que serão reduzidas para converter o regime daquele tributo de majoritariamente de “origem” para majoritariamente de “destino”. A intenção é combater a guerra fiscal e transferir mais recursos para os Estados consumidores, em geral mais pobres que os Estados produtores. Beleza. Contudo, esses fundos serão capitalizados com recursos incertos e não sabidos oriundos de “instituição e arrecadação de multa de regularização cambial tributária relativa a ativos mantidos no exterior ou internalizados”. A expectativa de que tais multas resultem em valores significativos é altamente duvidosa. Dizem alguns adivinhos que o montante de recursos brasileiros ilegalmente transferidos ao exterior atinge um saldo de US$ 500 bilhões. Ninguém sabe. De um modo geral, os recursos acumulados no exterior vêm sendo transferidos irregularmente há décadas, tendo como causas, que ainda perduram, a incerteza política, insegurança institucional, falta de confiança, má gestão pública e abusivo sistema tributário vigentes no Brasil. Sem falar em risco de confiscos, e em atividades criminosas mais pesadas tais como tráfico de drogas, de armas, contrabando, roubos, corrupção etc. Parcela considerável desses fluxos é antiga, e já pode ter sido “regularizada” no exterior, tornando-se possivelmente inalcançável pela proposta brasileira de “anistia onerosa”. Outra é oriunda de atividades criminosas, e por conta disso não abrangida pela Medida Provisória 683. E aqui reside enorme confusão, pois o governo exige que a origem dos recursos ilegais a serem internados seja comprovada. Certos “crimes” serão tolerados e outros não? E como tipificá-los claramente vez que em geral são ações complexas que envolvem diversas ilegalidades conjuntamente? Ademais, os detentores de recursos ilegais deverão avaliar se há vantagem em confessar os ilícitos, pagar multa e repatriá-los. Sabe-se que a cada dia torna-se mais arriscada e dispendiosa a prática de crimes econômicos e tributários. Mas a confissão de prática de ilícitos tais como lavagem de dinheiro, remessa ilegal e falsidade ideológica, mesmo que anistiadas, traz consigo riscos de denegrimento de imagem, sem falar na perspectiva de passarem a se tornar alvos preferenciais de futuras ações de fiscalização. Medidas tais como a proposta pela MP 683 já foram aventadas inúmeras vezes no Brasil, e praticadas algumas vezes no exterior, sem que se tenha notícia de sucesso. No momento o país enfrenta forte desgaste em sua atratividade econômica, Percebe-se que as remessas de capitais ao exterior, legais ou ilegais, estão aumentando. Pela primeira vez em sua história recente o país exporta seus talentos empreendedores. O Brasil, não se encontra em momento propício para atrair capitais.


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Marcos Cintra

Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA) e professor titular de Economia na FGV (Fundação Getulio Vargas). Foi deputado federal (1999-2003) e autor do projeto do Imposto Único. www.facebook.com/marcoscintraalbuquerque

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