Entrevista da Semana

Gustavo Monson: a vida dedicada ao bem através do CEU Ogum 7 Espadas

Cidade
Guaíra, 6 de maio de 2018 - 10h07

Gustavo Caramel Monson de Sousa, casado com Ana Paula, é pai de Marina de 11 anos e Gustavo de 8 anos. Nasceu em São Paulo, mas veio ainda bebê para Guaíra trazido pelos pais, Dr. Mauro Monson – médico – e Carolina, Professora. Gustavo não nos concedeu uma entrevista: deu uma aula de cultura, de erudição, de simpatia e de bom senso! Com uma facilidade incrível de expressão, e é por isso mesmo, que dentro da Caixa Federal o Instrutor Corporativo instrui na formação de novos profissionais que ingressam na rede bancária. Ministra cursos dessa instrutoria em várias cidades da região. A religião Umbandista é também parceira em todas as campanhas sociais da comunidade.

 

Então passou infância e adolescência em Guaíra?

Sim, estudei aqui até os 14 anos quando fui fazer o colegial em Uberaba, no José Ferreira. Em 1990, entrei na USP para cursar a Faculdade de História. Ainda não tinha 17 anos quando fui morar em São Paulo. Foi um misto de ansiedade, porque eu queria muito ir para a USP, queria conhecer uma cidade grande como São Paulo, porque os meus pais moraram lá por muito tempo e ao mesmo tempo cursar História, que por ser Ciências humanas, era minha paixão despertada na época do colegial, sob a influência das minhas professoras (Dona Cida André, por exemplo). Poderia também ter cursado Educação Física, outra paixão, mas acabei ficando mais 14 anos na Capital, dando aulas, como ACT, tanto em escolas do Estado como da rede particular. Fui professor de cursos preparatórios para vestibular, dei aula no Colégio Etapa e deixei um trabalho grande no Arquivo do Estado de São Paulo com a restauração de documentos históricos. Fui arquivista e também com iconografia e ainda conclui um curso de Licenciatura em Educação, sempre envolvido na área da Pedagogia.

 

Como veio trabalhar na Caixa Federal, em Guaíra?

Isto aconteceu em 2003! Prestei um concurso em 1998 e, no fim de 2002, já estava pedindo transferência para Guaíra. Sempre quis voltar! Minha família estava toda aqui! Tenho grande admiração por esta terra. Estou até hoje como bancário e de vez em quando sou chamado para a sala de aula.

 

Como surgiu a sua espiritualidade?

Nasci em uma família católica. Frequentava a Igreja quase que diariamente, fiz Catecismo, Primeira Comunhão, mas eu tinha uma curiosidade grande para estas “coisas” do espírito. Sempre achei que tinha algo mais! Achava que faltava alguma coisa. Então descobri, dentro da própria família, pessoas que frequentavam o Espiritismo. Ainda garotinho, comecei a frequentar algumas reuniões Espíritas de Umbanda. Eu adorava aquilo tudo. Só que eu era muito pequeno, não podia entrar, mas ficava imaginando e fui aguçando minha curiosidade. Comecei a estudar e, com 14 anos, um fato importante aconteceu: descobri o Orixá pela primeira vez. Há um termo, dentro desta espiritualidade que é “Bolou no Santo”, que é quando se perde os sentidos e a Mãe de Santo que me acolheu fez a leitura de que eu tinha o Xangô na minha vida.  Eu tinha Ogum e Xangô, que são deuses da mitologia africana. Aquilo me impressionou. Desde os sete anos eu já frequentava, tomava passes dos guias, dos Pretos velhos, dos Caboclos, dos Baianos… Aconteceu de eu ter que sair para estudar e fui exatamente para Uberaba, para fazer o colegial na “Casa da Espiritualidade”.

 

Foi planejado?

De modo algum. As coisas acontecem sem a gente planejar, conforme Deus orienta.  Fui lá para fazer um dos melhores colegiais da região e tive contato com vários centros espíritas, Chico Xavier estava lá, estudei a doutrina Espírita, frequentei outros templos de matriz africana, eu achava e ainda acho tudo isso muito bonito.

 

E o que aconteceu quando teve que ir para São Paulo?

Em São Paulo, comecei a sentir como se fosse uma cobrança. Não sei definir se era uma cobrança da espiritualidade ou se era uma autocobrança. Mas, eu sabia que tinha algo para fazer! Não basta somente estudar, trabalhar, eu senti que tinha que ir além. No fim dos anos 90, conheci a minha atual Mãe de Santo que é a Dona Maria Asseituno, de Sorocaba. Eu comecei a namorar minha esposa, que também era de Sorocaba, de família totalmente católica, tanto que no começo a gente ia às reuniões sem eles saberem, porque tinham medo, como existe muito preconceito. E a Semana de Ogum veio exatamente para esclarecer isso, pois não quero que as pessoas passem o que eu passei, é muito ruim não poder professar a sua fé com medo de receber alguma reação preconceituosa. Assim, a Ana Paula, minha esposa, tinha uma amiga que conhecia uma senhora que era muito idônea, que fazia um trabalho social muito intenso e me levou para conhecê-la. Quando cheguei lá, foi mágico! Já comecei a trabalhar com ela e ela me informou que eu tinha uma missão dentro da Umbanda.  Fiquei sete anos trabalhando com a Mãe Maria Asseituno.

 

Como é este trabalho?

É totalmente voltado para a caridade. Nada é cobrado! Não se cobra nada para atender as pessoas. Atende-se toda e qualquer aflição que a pessoa tenha na vida, porque a Umbanda tem que ser entendida como religião e não como uma aspirina. Sempre digo isso, porque tem pessoas que vão ao terreiro quando não estão bem e quando estão melhores deixam de ir. Hoje já há este novo conceito da Umbanda como religião tanto que o nosso templo que é o “CEU Ogum sete espadas” é um local de veneração dos Orixás. Lá presta-se uma homenagem para reverenciar e também se cuidar, para melhorar o seu dia a dia.

 

Assim sendo…

Então, assim sendo, no terreiro de Umbanda se faz tudo o que se faz em qualquer religião. A pessoa busca o autoconhecimento, a paz interior, evolução espiritual. Como é um tipo de espiritismo, não é a Kardecista, são religiões co-irmãs, mas a raiz é totalmente diferente. É um lugar onde se frequenta para se tornar uma pessoa melhor. Como Dalai Lama falou quando lhe perguntaram qual era a melhor religião? Ele respondeu que a melhor religião é aquela que te faz uma pessoa melhor…

 

Hoje ainda há muito preconceito?

Infelizmente sim! E o pior, é um preconceito velado! No Brasil há uma mistura, há a pajelança dos indígenas, há a influência do catolicismo, tanto que a gente usa as imagens que tem na Igreja Católica. Mas a origem é Africana. Como existe o pré-conceito e a gente traz essa herança da época do escravismo tem-se a noção de que tudo que vem do negro não é bom! Como a Umbanda é uma religião que vem do negro, então ela não é boa. Às vezes as pessoas cometem atos racistas inconscientemente, porque é uma cultura de 500 anos que tem no nosso país. A Semana de Ogum veio para esclarecer e trabalhar estas questões.

 

A semana de Ogum atingiu seus objetivos?

Superou os objetivos. Primeiro pela quantidade de pessoas que passaram ao longo dos três dias na Casa de Cultura. As pessoas se descobriam ali. Na verdade, todos têm alguma coisa do DNA negro. A mistura é muito grande. Estamos recebendo os povos da África desde 1530. A miscigenação é muito forte. A culinária africana está presente hoje em todos os lugares como a feijoada, o acarajé… A religião está no meio da Cultura de um povo, não tem como separar. Esta semana serviu para ressaltar a importância da cultura negra na formação do Brasil e da América. No curso que dou sobre Fundamentos Básicos de Umbanda, no nosso templo, fazemos este paralelo da cultura do tambor quando veio para América, que tem três vertentes: quando se une ao povo anglo-saxão se transforma em blues, que vira jazz, que vira rock. Quando o tambor se une aos espanhóis, na América Central e Caribe, vira o Chá-chá-chá e vira a Salsa, o Merengue. Quando vem para a América do sul, aí vira o samba e todas as suas vertentes!  A batida de todas estas músicas é africana!

 

E a música?

Pois é! Olha o exemplo do tambor! Ele está presente em toda a cultura negra. Ele é usado para atos cívicos, na guerra, no casamento, enterro, nascimento, em tudo há presença do tambor, que é um som para chamar os Orixás. Estou falando de uma cultura de quatro, cinco mil anos atrás… O atabaque, por exemplo, faz parte também da Cultura. O povo negro que veio para o
Brasil trouxe estes costumes, que são religiosos! Aí temos o MPB, o samba (que significa alegria) e mais  todas as vertentes do pagode, tudo é baseado no tambor africano. Quando se diz: “Vou para o samba”, o significado é: “vou para a alegria”.

 

A sua formação religiosa hoje!

Na nossa religião não se faz um sacerdote antes dele completar a maioridade espiritual. Na Umbanda, a maioridade espiritual se dá aos 21 anos. Antão um Babá (Pai) e uma Iyá (Mãe), daí vem o termo “Pai e Mãe de Santo”. A palavra “Pai” vem, porque ele cuida da sua comunidade espiritual como se fosse filhos. Nós cumprimentamos outros sacerdotes assim: “Um abraço para sua família carnal e para sua família de Axé ou de Santo”. Aos 17, fiz a iniciação e aos 21 anos fui iniciado pela mãe de Santo em Sorocaba, porque a Umbanda e o Candomblé são religiões iniciáticas, faz-se os rituais de iniciação. Tudo isso tem que se vivenciar, para isso se exige tempo, estudo, disciplina, frequência, não se torna um sacerdote de Umbanda e Candomblé lendo livros, tem que estudar, mas tem que se conhecer a oralidade, tem que vivenciar a vida de um templo. Depois, somente aos 28 anos o que equivale é um diploma de sacerdote onde se pode abrir a sua casa.

 

E os trabalhos aqui em Guaíra?

Comecei como muitos começam, num quartinho, em casa, mas chega-se num ponto em que não cabe mais! Até que um dia, o Guia Ogum Sete Espadas “Cobrou” um espaço maior! Pouco depois apareceu um terreno e, com a ajuda de muitos e de familiares, em 2007 nós abrimos as portas do “Ceu Ogum Sete Espadas”, como eu já estava coroado, eu tinha a autorização para abrir porque em Umbanda você não dá nada que não recebeu. Você só se levanta para ensinar se você se sentou para aprender. Há nesta religião uma hierarquia muito forte e não adianta ter tempo, disciplina, estudo, frequência se não tiver comportamento. Não adianta ter tudo isso e ser uma pessoa de má índole. Tem um comportamento a ser cumprido.

 

Agradecimentos

Em relação à vida, tenho que agradecer à Mãe de Santo, à minha esposa (emocionado), se ela não tivesse a tolerância para suportar a ausência, porque viajo muito, muitas reuniões nos terreiros… Agradeço à paciência da Ana Paula, o companheirismo… Meus filhos, pelas vezes que deixei de fazer, de compartilhar. Agradecer à prefeitura, ao Renato Moreira, ao Sidnei da Cultura, ao Zé Eduardo, prefeito, aos vereadores, à Dra. Bia Junqueira, autora da Lei do dia de Ogum, dia de São Jorge, Conselho da comunidade Negra, Comir de Barretos, à OAB de Barretos e à Dra. Luciana também de Barretos, que falou lindamente. Ninguém faz nada sozinho. Minha gratidão por esta segunda semana.

 

Para terminar

O terreiro está aberto a toda comunidade. Nosso Blog: www.ceudeogumseteespadas.blogspot.com. Vejo os nossos dias atuais muito trevosos, não temos conceito de diabo, acreditamos que existam trevas que é a ausência de luz. A luz para nós é Deus. Falta para a vida das pessoas a presença de Deus. Independente de qual seja o credo, as pessoas devem buscar o sentido Latim da religião. O grande mal da juventude são as drogas e as bebidas. Acho que quem tem Deus no coração e segue uma religião, busque seguir os preceitos, não importa qual religião seja, porque isto nos coloca uma disciplina religiosa, então, a pessoa acaba evitando muitos males porque tem que se cumprir aquela disciplina religiosa. E isto coloca a pessoa no caminho de Deus, não importa o nome da religião. Volto a citar Dalai-Lama: Não importa a religião, siga aquela que te faz uma pessoa melhor!


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