A crise hídrica, que se agrava em todo o país, é motivo de grande preocupação para os produtores rurais paulistas. Em Guaíra, a situação é tão grave que, através da criação de um Comitê de Gestão Pública, formado por técnicos do DEAGUA, Secretaria Municipal de Agricultura, Abastecimento e Meio Ambiente, produtores rurais, DAEE (Departamento de Águas e Energia do Estado de São Paulo) e Sindicato Rural, ficou definido que os agricultores não devem realizar o plantio da terceira safra.
Dessa maneira, desde o dia primeiro de julho, nenhuma propriedade na linha acima da estação de tratamento de água deve ligar o seu sistema de irrigação, garantindo o nível aceitável do Ribeirão do Jardim para captação e distribuição de água pela ETA e, assim, manter o abastecimento da cidade.
“E atravessando um momento muito crítico para a agricultura do nosso município, principalmente aqueles que dependem da irrigação. De um modo geral, estamos enfrentando um índice pluviométrico muito baixo semelhante àquele de 2014, quando secou a nossa lagoa do Parque Maracá. Para se ter uma noção, estamos iniciando o período da seca agora, começando o inverno e o índice pluviométrico é muito pequeno. Assim, um comitê foi feito e todos concordaram em não plantar a terceira safra (julho, agosto e setembro), nenhum tipo de plantio em área irrigada. Isso é um ganho para a cidade, porque a prioridade é o abastecimento da população, mas isso pode acarretar em prejuízos não só para os agricultores. Acredito que teremos problema sim no decorrer dos meses”, informa o engenheiro agrônomo do Sindicato Rural de Guaíra, Renato Massaro, que apontou outra situação que os agricultores locais enfrentam no momento. “Tivemos essa geada na semana passada que, de uma certa forma, prejudicou as lavouras instaladas, tanto na irrigação quanto na área de sequeiro. Isso veio acarretar um problema sério aos produtores. Na cana, apesar de ser uma cultura muito resistente, pode ter certeza que isso refletirá no próximo ano”, analisa.
“Como choveu muito pouco em 2020, não temos também armazenamento no solo suficiente para alimentar os rios e lagoas. Muitas secaram, praticamente acabaram, os rios estão em volume muito baixo, algo que não se via há anos. Teremos sérios problemas”, adiciona.
O governo municipal agradeceu à classe rural por abrir mão da safra. “Quero agradecer aos produtores rurais que entenderam a nossa situação. Não podemos deixar faltar água para a população. Parabenizo a todos eles que, sensíveis ao problema, criaram o sistema de rodízio na irrigação e também não irão plantar a terceira safra, preservando assim o nosso Ribeirão do Jardim, para o abastecimento humano e também para os animais e os peixes. É momentos de dificuldade que a gente sempre pode contar a sensibilidade dos agricultores de Guaíra”, enfatizou o
chefe do executivo.
Consumo acima da média
Ao relatar todas as medidas, o prefeito Edvaldo Morais fez questão de conclamar a
população a colaborar com a economia de água. “Estamos passando por uma longa
estiagem. A água é um bem finito e temos que economizar. Mesmo a água sendo
barata em Guaíra a população não pode neste momento desperdiçar este bem tão
precioso. Temos que economizar para não faltar”, comentou o chefe do executivo.
Pelo consumo de água aferido pelo DEAGUA, a população guairense utiliza, em média, 300 litros de água por pessoa, diariamente. O recomendado pela Organização Mundial de Saúde é de 50 litros por pessoa, para não haver desperdício. A média brasileira de consumo de água por pessoa é de 187 litros por dia; ou seja, o consumo em Guaíra está muito acima do nível aceitável. “Estamos adotando todas as medidas para que a população não sofra com a falta de água como aconteceu no ano passado, mas a participação e consciência do cidadão é imprescindível para que este problema não aconteça novamente. Não é o momento de desperdiçar água. Vamos evitar lavar calçadas, carros e adotar medidas de economia. A responsabilidade não é só da prefeitura, do DEAGUA ou dos produtores rurais e sim de todos nós”, alertou Edvaldo.
Mais ações do governo
O atual governo também precisa adotar ações próprias para evitar o desabastecimento, mas retirá-las do papel e colocá-las em prática. Entre elas, o novo reservatório para 1 milhão de litros no Bairro Tonico, que já está licitado, mas que, até a última semana, ainda não havia obras no local; e também a perfuração de um novo poço profundo, junto ao reservatório instalado no Bairro Jardim Eliza.
FAESP se posiciona sobre crise hídrica no estado
A Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp) avalia que, caso medidas não sejam tomadas, haverá impactos negativos na economia e no segmento rural, com a possibilidade de quebra de safras e alta no preço de alimentos. “O avanço da crise hídrica e o aumento na conta de energia acenderam novo alerta para os agricultores paulistas”, destaca Fábio de Salles Meirelles, presidente da Faesp. “É preciso que as autoridades municipais, estaduais e federal atuem no sentido de fazer frente a esses fenômenos climáticos”, completa.
O agronegócio oferece relevante sustentação ao PIB e à balança comercial e garante o abastecimento da população sem interrupções, mesmo com tantos desafios, como a não regularidade das chuvas, a reposição dos vários corpos d’água e o aumento do custo da energia. “Em 2020, fomos responsáveis por um volume bruto de produção de R$ 1,98 trilhão”, revela Meirelles.
Na parte elétrica, o recente reajuste nos valores das bandeiras tarifárias vai provocar o encarecimento da energia elétrica. Nesse sentido, o reajuste para a bandeira vermelha – patamar 2 passou de R$ 6,24 para R$ 9,49 a cada 100 kWh consumidos, um aumento de 52%. “Os reajustes batem na cadeia produtiva e se estendem ao consumidor, que é quem compra carne no açougue e o arroz e feijão no mercado, e fica com a conta final. A crise hídrica deve ser observada com atenção pelas autoridades e medidas deverão ser tomadas, como a revisão das altas taxas de energia, por exemplo, para não causar o encarecimento dos alimentos”, explica Meirelles. “Também não desejamos que se imponham medidas restritivas à irrigação, pois isso traria grande impacto na produção de hortaliças.”
Inteligência no campo
Na contracorrente da pandemia, o campo mantém o ritmo de modernização e busca superar os obstáculos do novo normal. “A inclusão digital é muito importante para o agricultor durante a pandemia”, diz o presidente da Faesp. “Por isso, estamos nos modernizando, discutindo métodos de irrigação e ampliando a utilização de energia fotovoltaica. Defendemos o uso consciente e responsável da água e da energia, a fim de otimizar as operações agrícolas e melhor aproveitar cada cultura”, comenta.
A Faesp promove as boas práticas do uso da água e vem realizando esforços para tornar a tecnologia mais acessível aos produtores paulistas. Nesse sentido, desenvolve comunicação assertiva com os sindicatos rurais, de modo a aperfeiçoar as atividades de irrigação, além de outras práticas, visando garantir maior produtividade agropecuarista.
Segundo a Faesp, com a irrigação inteligente com tubulações subterrâneas é possível aplicar água e nutrientes diretamente à raiz da planta, oferecendo maiores benefícios para o seu cultivo e acelerando o ciclo produtivo em até 40% em relação ao sequeiro, conforme estudos e experimentos no campo. Hoje com os recursos da informática, os processos podem ser automatizados e fornecem a possiblidade do gerenciamento de todos os detalhes da irrigação e da nutrirrigação de maneira prática, moderna e eficaz. Isto contribui para melhor aproveitamento dos recursos hídricos e fertilizantes, evitando desperdícios.
A tecnologia está aí para contribuir para uma agricultura mais eficiente e com custos menores, inclusive com fontes alternativas de geração de energia, como o uso da biomassa, eólicas e solar ou fotovoltaica, que passam a ser uma alternativa a mais para o produtor rural, com a vantagem de ser renovável e sustentável. Segundo dados de 2020 da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), o setor rural responde por 13,2% da potência instalada no Brasil e os investimentos nas propriedades passam de R$ 1,7 bilhão.
De acordo com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), em 2020 a capacidade instalada de geração de energia elétrica foi de 174,7 GW, sendo que a Solar, Biomassa e a Usinas Eólicas, representaram 21% desse total.