“Eu me amo”

Editorial
Guaíra, 5 de abril de 2023 - 11h19

O título é uma lembrança de uma música homônima do Ultraje a Rigor que satiriza o narcisismo contemporâneo. A música é simples: um sujeito vivia triste e sem sentido, até que descobre a maravilha que ele próprio é e passa a amar-se a ponto de não mais poder viver sem si mesmo. A letra é muito feliz, pois pega nesse escracho o absurdo do narcisismo contemporâneo.

O narcisismo é um tema que tem sido cada vez mais discutido na sociedade atual, especialmente quando se trata da nova geração. Com o crescimento das redes sociais e da cultura do individualismo. 

Aliás, a cultura atual pode estar contribuindo para um aumento deste comportamento . As redes sociais, por exemplo, encorajam a exposição constante da vida pessoal e o culto à imagem. É fácil se tornar obcecado com a própria aparência e com a busca por atenção e validação nas mídias sociais. Além disso, a sociedade atual é mais focada no indivíduo do que nas comunidades, o que pode incentivar a busca por satisfação pessoal em detrimento do bem comum.

O problema é que somos tão individualistas e tão narcisistas que não admitimos o quanto somos dependentes. Sonhamos em ser ermitões espirituais, não depender do reconhecimento alheio para nada. Seria uma boa ideia senão pelo detalhe de vivermos em sociedade. Isso pode funcionar porque é o canto de sereia que queremos ouvir, gostamos de fantasiar que querer é poder e que alguém determinado não tem limites. Gostamos de pensar que poderíamos ser uma fortaleza psíquica cheia de vontade, com uma energia sem fim.

Não é difícil sentir-se assim, é algo que todos podemos em algum momento experimentar, pois trata-se dos momentos em que estamos identificados ao nosso ideal de ego.Quem acreditar nisso vai ficar jogado numa dinâmica maníaco-depressiva e cada vez que o sujeito esbarra na realidade tropeça e cai, para sair da depressão reinventa a miragem narcísica e segue até o próximo tombo.

Importante lembrar que o narcisismo não é exclusivo dessa faixa etária. Na verdade, ele existe em todas as idades e pode ser encontrado em todas as culturas. Aliás, nem todas as características atribuídas ao narcisismo são necessariamente negativas – o amor próprio e a autoestima são, em muitos casos, considerados aspectos saudáveis do desenvolvimento humano.

Em vez de tentar achar culpados ou mesmo criticar o “modus operandi” de uma sociedade cada vez mais conectada, é importante pensar em como podemos lidar com esse problema de forma eficaz. Uma abordagem seria incentivar a educação emocional e social desde cedo, ensinando às crianças habilidades de comunicação, empatia e resolução de conflitos. 

Também é importante promover uma cultura que valorize a humildade, a compaixão e a colaboração, em vez de incentivar a competição e a busca por status. E um bom começo seria  contrabalançar  o “Eu me amo” do Ultraje a Rigor com um pouco mais de  “A vida é a arte do encontro” de Vinicius de Moraes.

 


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