Nossas Mães

Cidade
Guaíra, 11 de maio de 2025 - 09h32

Por:  Marli Vaccaro 

Somos filhos, netos e primos de mulheres com fibra, com mãos calejadas, mas unidas por coração imenso e cheio de bondade. Nada as impedia, nem marido, nem filhos, de fazer o bem. Mesmo com filhos para criar, dedicavam-se à família: irmãs, sobrinhos, os mais desafortunados, e até desconhecidos.

Hoje, com 82 anos, tenho uma profunda admiração por minha mãe, que abria seu coração para todos, de maltrapilhos à endinheirados. Fazia quibe com maestria nos fundos da casa dos noivos enquanto a família se embelezavam para o casamento mais a noite.

Era de uma pureza de caráter, onde se encontravam só qualidades. Hoje, depois do encontro com meus primos, senti vontade de relembrar o dom dessas mulheres impares. Acho que bondade é um sentimento genético. Todos nós, com egoismo e outros sentimentos não ótimos, temos em nossas veias alguns pigmentos de bondade, esses encontros fazem tão bem a saúde mental, que acordei querendo mudar o mundo com minhas próprias mãos.

A tia Jamile, a mais velha e sofredora, quando minha avó Marien faleceu, ficou com a incumbência de cuidar do meu avô José, um político eminente do Líbano, e que quase não falava português direito, e dos irmãos mais novos.

Eu não me sinto humana, quando destratam os imigrantes, eles só queriam um lugar para viver em paz.

Família, isso é querer demais? A tia Jalile a mais bonita, alta, com uma pele de pêssego, morena, cabelos ondulados, pareciam que estava sempre maquiada, teve a má sorte de casar com um jogador de baralho que acabou com tudo(desculpa Amir). Tudo que a família construía, ele perdia no jogo, mas eu nunca escutei reclamar dele ou de algum filho, sorria, apenas sorria e chamava  a Tati de Sebastiana, sem conseguir pronunciar as sílabas mais complicadas.

A tia Nadoa, era a mais divertida, e desbravadora, ela que era a chefe da família, o tio Vicente idealista, entendia de futebol, e tinha que prover a casa. 

Na verdade, quem cuidava das finanças era a minha tia. Quando ela recebia o jornal a casa dela se transformava, cortinas novas, almofadas, tudo com o maior bom gosto e pouco custo. Seus filhos, herdaram a sua maestria com as mãos e a sua força de caráter. Por fim, antes de falar mais um pouco da minha mãe, vem a tia Olga a mais nova das mulheres. Ela era a paciência em pessoa (em relação a mim), me ensina a fazer bolo, conversava como amiga e companheira, com 5 crianças, uma por ano, era,  capaz de dar atenção e gostar muito de mim, apesar do meu gênio, explosivo e egoísta. 

Eu adorava ir na sua casa, porque era recebida de braços abertos. O Tio Nenzinho,   que nem me olhava direito, nunca vi os dentes dele e nem o olhar carinhoso. Minha tia também carregava a família, sofria calada, mas era muito generosa. Eu, sinto muita falta de todas elas. O que uma sentia, era dividido igualmente entre todas. 

Para coroar estas lembranças alegres e divertidas, não posse deixar de falar da minha mãe, ela era, o elo de ligação, entre elas, nunca falava uma palavra de desagrado para nenhuma delas. 

Como estava em melhor posição financeira do que as outras, fazia meu pai ajudar todos eles.

Meu pai, um italiano meio bronco, mandava ou queria mandar em todos, não adoçava as palavras nem para minha mãe e nem para mim. Queria tal coisa e ponto final, ninguém o contradizia. 

Minha mãe era sua escrava predileta, ralhava (essa palavra é tão antiga) com ela por tudo, até nas horas de lazer ele mandava, todos tinham que obedecer, era o mandachuva, da minha vida e dos outros. No melhor da festa, minha mãe ia me buscar no Grêmio, era constrangedor, avistar minha mãe toda desarrumada para ir embora. Quem levava a culpa, ela, só ela. 

Ficava com raiva de quem só me amava e protegia, do coronel.

Quanto aos meus primos foi e é prazeroso nossos encontros. 

Eu me lembro com nitidez da Nazira a mais bonita de todos, ela era uma das filhas da tia Jalile que nasceu sem nanismo, mas com o coração não muito sadio, e foi o filho dela que teve a ideia de nos reunir. 

No começo, achei que não iria gostar de tais encontros, mas minha filha, a Tauana fez tudo para eu ir. 

Fui e gostei, é daí a vontade de não deixar esses pensamentos sobre nossas ancestralidades se perder…

Lembrei – me de dois fatos que rimos muito. Como eram libanesas, foram alfabetizadas no seu país de origem, e então falavam um português capenga. Mas a tia Nadoa era tão mais ativa que as outras que pegou Senhorinhas para alfabetizá-las, só que ela trocava o P pelo B, então vocês imaginam a confusão. 

A outra história é que a tia Elisa (uma tia rica do lado do meu pai e vizinha da tia Nadoa) pediu para ela consertar uma porção de roupas. Passou um mês, dois e nada. 

Um dia ela viu uma senhora passar com uma roupa igual a dela e foi correndo perguntar a tia Nadoa, ela só respondeu, você tem tanto que em vez de consertar, eu dei, todas para os pobres. 

 


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