Durante anos, em Guaíra, um problema silencioso acompanhou centenas de famílias: casas erguidas com suor e sacrifício, especialmente em conjuntos habitacionais, permaneciam sem escritura definitiva. Eram lares cheios de vida, mas incompletos no papel. A cada tentativa de regularização, surgia a mesma barreira: a legislação municipal não previa de forma clara como lidar com pequenas irregularidades de calçadas e alinhamentos de loteamentos. O resultado era um impasse que atravessava décadas, transformando sonhos de propriedade plena em longas esperas.
Esse impasse começa a ser resolvido com a sanção da Lei Complementar nº 3.322, assinada pelo prefeito Antonio Manoel da Silva Junior no dia 17 de setembro de 2025. A medida altera dispositivos da legislação de uso e ocupação do solo e traz regras que permitem à Prefeitura autorizar, após fiscalização, a retificação de imóveis lindeiros às vias públicas. O novo texto redefine o conceito de passeio, adota padrões técnicos de acessibilidade previstos na ABNT – NBR 9050/2020 e estabelece que a calçada deve garantir sempre uma faixa livre de pelo menos 1,20 metro para a passagem de pedestres.
Na prática, a lei oferece caminhos para destravar escrituras que estavam paradas por detalhes técnicos. Imóveis que avançaram alguns centímetros sobre a calçada, por exemplo, poderão ser regularizados, desde que respeitada a faixa mínima de circulação e, em alguns casos, mediante pagamento de uma Cessão Onerosa definida pela Diretoria de Tributos. Trata-se de um ajuste burocrático, mas que, para a população, pode significar muito mais: o fim de uma espera angustiante por um documento que legitima a posse do lar.
Famílias que antes não podiam vender legalmente suas casas, obter financiamentos ou deixar o imóvel de herança agora poderão fazê-lo com tranquilidade. A lei, embora nasça técnica, carrega um efeito social profundo. Para quem construiu a vida principalmente em conjuntos habitacionais, cada metro quadrado tem uma história: o muro levantado nos finais de semana, o quarto ampliado com a chegada de um filho, o quintal transformado em horta. A escritura, finalmente possível, é o reconhecimento formal de tudo isso.
A cidade, ao corrigir um problema que se arrastava há anos, dá um passo não apenas no ordenamento urbano, mas na valorização da dignidade de seus moradores. A Lei Complementar nº 3.322/2025 encerra uma longa novela de insegurança jurídica e abre espaço para que o direito de morar venha acompanhado da propriedade garantida. E, no coração das famílias, talvez a sensação seja simples: depois de tanta espera, enfim, a casa é delas também no papel.