Como expresso no título desse texto, as APAEs não são coisa do passado. Pelo contrário, as escolas especializadas são parte inescapável do futuro, a não ser que decidamos nos afastar dos princípios fundamentais dos Direitos Humanos e abandonar as pessoas com deficiência com quadros com maior comprometimento.
Desde há muito se faz, no Brasil, o discurso de que salas e escolas especializadas são “coisa do passado”, “retrocesso” e que o único espaço de escolarização das pessoas com deficiência é a sala comum. Mas como definir se algo é ultrapassado? Como saber se a adoção de uma certa abordagem é um retrocesso?
É difícil responder a essa provocação, mas sigamos aqui duas diretrizes: a) olhando para os países desenvolvidos; b) olhando para os resultados de pesquisa que avaliem os desfechos daquilo que se propõe.
Então vamos começar pelos países desenvolvidos: no caso dos autistas, nos EUA cerca de 5,4% estão em escolas especializadas, enquanto na Finlândia são cerca de 8,6%, só para ficar em dois exemplos. Se for melhor uma afirmação mais peremptória, neste caso, ela é fácil – não existe nenhum país desenvolvido no planeta que tenha acabado com as escolas especializadas.
O segundo tópico, os resultados de pesquisa, é muito mais complexo, uma vez que não dá para fazer estudos randomizados em que os cientistas decidem a vida escolar de crianças com deficiência, essa é uma decisão dos pais, que tende a encaminhar casos com maior comprometimento para escolas especializadas e com menor comprometimento para escolas comuns, é o natural, mas dificulta a vida do pobre cientista.
Dentro de uma avaliação compreensiva de todo o conjunto de pesquisas disponível, entende-se que a escola comum é o melhor ambiente de escolarização da maior parte dos estudantes com deficiência, lá eles aprendem mais, fazem mais amizade e, de quebra, ajudam os colegas sem deficiência a lidarem melhor com a diversidade do mundo.
Mas esta não é a verdade para todos os alunos, uma porção com maior comprometimento, normalmente autistas de nível 3, alunos com deficiências múltiplas ou com Deficiência Intelectual grave ou profunda, se beneficiam mais de escolas especializadas.
Nas escolas comuns esses alunos não aprendem o currículo e também não socializam. Para eles, uma escola altamente especializada e com forte integração terapêutica é a melhor hipótese, inclusive a que produz as melhores taxas de empregabilidade na vida adulta.
Não resta dúvida, as escolas especializadas, em geral e as APAEs, em específico, não estão em nosso passado, estão no horizonte, ao menos se quisermos apoiar da melhor forma possível as pessoas com deficiência com maior comprometimento!
Lucelmo Lacerda é doutor em educação, pesquisador na Universidade da Carolina do Norte (EUA), ativista do TEA e autor de “Crítica à pseudociência em educação especial”.