Um trabalho, uma paixão, uma lição de vida

A história real da vida de dois carteiros, Milton e Ariovaldo, que estão se aposentando e que mostram o amor pela profissão

Entrevistas
Guaíra, 24 de junho de 2019 - 11h56


A entrevista deste domingo tem a grata satisfação de conferir alguns lances da vida de dois funcionários dos Correios de nossa cidade que estão se despedindo das suas funções por força de uma merecida aposentadoria. Milton Teodoro da Silva, casado há 31 anos com Eliane Alves da Silva, pai de Jéssica e Ariovaldo Gomes da Silva, casado há 30 anos com Iraci Aparecida, pai de Amanda (casada com André) e Alana (casada com Carlos Eduardo), é avô de Otávio. Tanto Milton quanto Ari têm uma memória prodigiosa, se lembram dos nomes dos moradores, da rua e do número das casos. Ambos reconhecem que sempre trataram com cortesia e educação todos os munícipes e que por isso mesmo são reconhecidos como funcionários capacitados e profissionais eficientes e educadíssimos.

 

Milton, quantos anos trabalhando nos Correios?

Estou me aposentando com 38 anos de serviço nos Correios. Entrei para esta empresa quando tinha de 19 para 20 anos. Antes disso trabalhei no antigo supermercado ”Guaíra Serv”. Sai deste supermercado no dia 31 de Janeiro e entrei no Correio dia 02 de Fevereiro do ano de 1.981. Durante toda minha vida fiquei apenas um dia desempregado…

 

E você Ari?

Eu entrei no Correio em 22 de Abril de 1.986. Completei, então 33 anos de serviço em Abril deste ano.

 

Então vocês tiveram uma profissão ”mais humilde” antes de ser funcionário?

Milton – Antes de entrar no supermercado, fui picolezeiro, vendia picolé na rua. Meu pai, Seu Zico, vendia picolé na porta da escola Francisco Gomes. Herdei esta profissão do meu pai, uma profissão digna como qualquer outra.

Ariovaldo – Antes, trabalhei em vários lugares, inclusive de ”boia-fria” e nunca fiquei desempregado, Graças a Deus. Não tenho vergonha de dizer que desempenhei estas funções porque sempre tive orgulho do que fiz, porque sei que o trabalho dignifica o homem.

 

Olhando lá para o começo, vocês podem afirmar que se sentem realizados?

Milton – Com certeza. Acho que Deus foi muito generoso comigo. Tenho muito orgulho de estar aposentando e saindo de cabeça erguida. Tudo que tenho devo aos Correios, uma empresa séria, comprometida com os bons serviços.

Ariovaldo – Para mim, o Correio foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida. Nesta empresa me realizei pessoalmente, construí minha família, criei minhas filhas, realizei meus sonhos. Passei grande parte da minha vida nesta empresa e tenho grande gratidão pelos Correios. Ali desempenhei um trabalho honesto e gratificante.

 

Vocês trabalharam na parte interna e externa?

Milton – Hoje eu trabalho na parte interna, mas quando entrei, em 81, eu era auxiliar de carteiro, era um cargo que se chamava ASP (Auxiliar de Serviços Postais) depois de quatro anos o próprio Correio me incentivou a estudar para crescer na empresa. Estudei e passei a ser carteiro. Após, fiz um processo interno e exerci a função Tesoureiro, sempre estudando e crescendo. Me aposento nesta função.

Ariovaldo – Entrei na função de carteiro em 1986. No ano de 2002, o Paulinho, nosso gerente, me ofereceu para trabalhar internamente. Fiquei responsável pela distribuição por quatro anos. Depois disso voltei ”para rua” e estou até hoje. Tive oportunidade de ser atendente, mas vi que me realizo e gosto ”da rua” me sinto melhor assim, em contato com as pessoas.

 

Contem uma passagem que emocionou…

Milton – Uma das passagens que nunca vou esquecer aconteceu na época em que surgiu este evento social que o Correio faz que é do ”Papai Noel dos Correios”. Eu tive a oportunidade de me vestir de Papai Noel por diversas vezes e ir entregar o presente para as crianças nos bairros mais carentes, esta lembrança me emociona até hoje. Não tem como descrever o brilho dos olhos das crianças recebendo um presente das mãos do Papai Noel. Jamais vou esquecer estes episódios e tenho muito orgulho de ter participado desta felicidade oferecida aos pequenos.

Ariovaldo – Várias passagens me emocionaram, mas quando entrei no Correio, fui entregar uma carta em certo endereço, era a casa de uma senhorinha. Falei o nome e ela se identificou e quando entreguei a carta ela me disse: ”Meu filho, eu não sei ler, você pode ler esta carta para mim?” Nesta hora, fiquei em dúvida, eu tinha acabado de entrar neste serviço e não tinha certeza se podia ou não fazer isso. Mas, uma força dentro de mim encaminhou para o lado certo. Ela me autorizou abrir a carta e ler a mensagem. Era uma carta de um filho dela que estava dando notícias, pois fazia muito tempo que ela não sabia como ele estava. Ela me agradeceu de tal maneira que fiquei gratificado de ter agido daquela maneira. Aquele agradecimento sincero e emocionado da senhorinha me comove até hoje.

 

Estão deixando o serviço com a sensação do dever cumprido?

Ariovaldo – Estou deixando com a sensação que cumpri uma missão.

Milton – A vida da gente é feita de etapas. Sinto que cumpri mais uma etapa da minha vida…

 

O que estão projetando para o futuro?

Ariovaldo – Não quero ter projetos. Quero curtir mais meu netinho, mas quero viver um dia de cada vez.

Milton – Não quero ter compromissos (risos). Este negócio de horário para levantar, para almoçar, para sair… não quero mais não.

 

E os cachorros (risos)?

Ariovaldo -Já fui mordido por cachorros (risos). Hoje é um olho na correspondência e outro no cachorro. Existem muitos cães nas ruas hoje em dia, mas aprendi a driblar estes animais que merecem nosso carinho…

Milton – Também já fui mordido por cachorro (risos) quando fui carteiro. Parece que eles sentem o cheiro do carteiro. Mas, a gente aprende a lidar com a situação…

 

Hoje ainda existem cartinhas?

Ariovaldo – Diminuiu muito por conta dos computadores e celulares. Mas as cartas que ainda existem hoje, são mais dos detentos para os seus familiares e vice versa.

 

Uma curiosidade: O que são feitas das correspondências cujos endereços não são encontrados?

Ariovaldo – Geralmente tudo é entregue, pode atrasar mas são entregue.

Milton -Quando o endereço é inexistente, volta para o remetente. Se não tiver remetente, pelo carimbo dá para ver a cidade de origem. Lá o que chamamos de refugo é destruído e reciclado.

 

Têm agradecimentos?

Ariovaldo – Eu tenho que agradecer a todos os funcionários dos Correios pelo companheirismo, pela colaboração. Agradecer a população de um modo geral que sempre nos tratou com educação, porque sempre fui bem recebido. Grato pela oportunidade que o jornal esta dando de me despedir de todos, estou emocionado e dizer que vai ficar saudades. Ainda agradecer a Deus, a família pelo apoio. Aliás, família gostaria que eu já tivesse deixado o serviço em 2016 quando teve o assalto. Hoje este episódio está superado, fui o primeiro a ser rendido, fiquei amarrado no chão, foi um momento difícil, mas está tudo no passado. Queria deixar aqui um agradecimento especial para uma pessoa que já não está entre nós, mas que não sai do coração que é o Darci. Tenho uma gratidão eterna e um carinho grande por ele.

Milton – Também devo uma obrigação grande pelo saudoso Darci. Tenho muito que agradecer a Deus, a população toda que sempre esteve presente na minha vida. Sou grato a minha família, agradeço ao Paulinho, na verdade tenho muito que agradecer.



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